quinta-feira, 29 de novembro de 2007

O Último Dia de Auto-Repressão

Acordou com uma certeza estranha na cabeça: esse era o seu último dia no mundo! Não entendia como poderia ter tanta convicção assim de que tal assertiva era verdadeira. Simplesmente acordou sabendo disso. “O que vou fazer hoje então?” - pensou ele – “tenho meu trabalho, horários a cumprir. Sou um homem respeitado e pessoas dependem dos meus serviços”. Olhou ainda sonolento, com sua roupa velha e desgastada que usava pra dormir, para o relógio despertador que repousava sobre seu criado-mudo: 05:43. “Bem, meus desejos, será que os devo realizar? Minha família... visitá-los seria uma boa opção? Ou será que eu deveria tentar um último encontro com ela?” – suspirou ao pensar nessa última opção. Ficou a planejar durante uma hora, sem se dar ao trabalho de se levantar da cama, o que poderia fazer nesse dia: o último de sua existência. Encaixou familiares, desejos banais e a sua desesperada e última tentativa de sair com a sua paixão de adolescente. Todo seu dia fora ocupado, tudo esplendidamente organizado para o seu dia final.

Observou sorridente, como quem fez uma mágica com o tempo, a listinha rabiscada num pedaço de papel arrancado de um bloco de notas qualquer, mas aos poucos o sorriso triunfante deu lugar a uma cara pensativa, e logo após uma face séria e determinada apareceu nele. Sabia que tinha muitas vontades a realizar, mas sentia que deveria reprimi-las; sabia que sentiria falta dos seus parentes e amigos, entretanto, já passara tanto tempo da sua vida com eles, que apenas esse sem os ver, como tantos outros, seria apenas mais um dia de desencontro familiar; e o medo de ser mais uma vez rejeitado por quem ama, mesmo sem nunca ter tentado mais de uma vez conquistá-la, sempre tendo vivido com o peso de um assunto inacabado por na frente dela se emudecer, fê-lo se fixar ainda mais nessa idéia.

Com o seu altruísmo que se orgulhava em afirmar e preservar, mesmo que com pesar, decidiu, segundo sua razão, que era mais proveitoso para o mundo que ele fosse ao seu trabalho primar pelo bem da sociedade, visto que cumprir seus desejos e certas necessidades como atitude final de sua existência era uma atitude puramente egoísta e indigna. Muito melhor seria se ele servisse ao mundo até o seu último segundo de vida do que desperdiçar esse tempo com tolices vãs, próprias de alguém egocêntrico e que não tem comprometimento com a vida de seus semelhantes.

Foi tomar banho, e durante sua limpeza corpórea, imaginava ele ter deixado a mente a mais pura possível depois da seriíssima decisão tomada, afinal, quem mais seria assim tão solidário? Preparou seu café-da-manhã, arrumou-se devidamente e apanhou as chaves de casa e carro. Durante seu percurso em direção ao trabalho, pensava com uma certa tristeza nas coisas que ainda sonhava em fazer, imaginava-se realizando cada uma delas, mesmo as que nesse seu último dia não poderia, mas sabia que escolhera o melhor para todos, já que seus desejos só serviriam a ele, o qual não teria mais um futuro considerável, e seu trabalho serviria a pessoas que graças a ele teriam uma jornada a percorrer.

Avistou então a universidade onde lecionava, estacionou seu carro, tomou nos braços seus livros de filosofia de seu autor tão aclamado, deu um brevíssimo sorriso e foi à sala dos professores. Cumprimentou como de praxe os outros professores, sentou-se formalmente numa cadeira qualquer que lhe desse uma visão do corredor pelo qual os alunos passariam em direção às suas respectivas classes, e enquanto isso ele ainda vistoriaria brevemente as suas anotações para esse dia. Conversou um pouco menos que o normal com seus colegas de profissão, bebeu seu costumeiro café e, enquanto olhava a aula que teria que dar, por acaso encontrou entre a confusão de conceitos que citaria o pequeno pedaço de papel com a lista do que gostaria de fazer. Olhou com pesar para ela e a guardou carinhosamente no bolso da sua camisa social bem passada, pegou sua pasta e livros e foi à sala de aula.

Ao adentrar no seu local de trabalho, avistou seus alunos, cumprimentou-os mais formalmente que o normal e iniciou sua costumeira aula. Ele não era o tipo de professor que fazia sucesso entre os alunos, todavia não entrava no hall dos que eram odiados. Sempre fora isso, alguém que não incomodava, não se destacava em nada, alguém que sempre esteve simplesmente na média, nada além ou aquém disso. Após sua costumeira aula almoçou e foi descansar seus curtos minutos pós-refeição antes de começar a ler trabalhos, corrigir testes e todas essas obrigações de quem é um professor responsável e que segue à risca toda a tradicionalidade que é aclamada. Sentia uma imensa vontade de sair para passear, ver alguns amigos e amigas, fazer algo de inusitado, mas reprimia tal vontade por algo que considerava como bem maior.

Chegou o momento de dar sua aula à noite. Estava mais ansioso, sabia que eram suas últimas horas, mas ele ainda tinha tantas coisas que precisa fazer... Sentia-se incapaz por isso, mas seu altruísmo o fazia pensar que sua escolha fora a melhor possível. Começou a dar sua aula, suava frio, mas será que conseguira acabá-la? Começou a tremer de ansiosidade, não queria que aquele fosse seu último dia. Não fizera nada de mais, fora simplesmente mais um dia rotineiro, e ainda pior, uma vez que sabia que seria o último, tinha consciência disso e não o aproveitou. O desespero tocou sua mente e de repente, como alguém que não sabe ao certo pra onde ir, saiu da sala de aula sem dar nenhum tipo de explicação, enquanto procurava entre os bolsos o pequeno pedaço de papel com a programação que tinha preparado antes de decidir manter a posse altruísta. Mesmo sabendo tudo decorado e tendo noção de que não poderia fazer tudo o que tinha planejado, foi desesperado atrás de corrigir o que fizera, ou deixara de fazer.

Ligou o carro e saiu nele o mais rápido que pode da universidade. Não foi preciso pensar muito pra decidir aonde ir primeiramente. Dirigiu com toda velocidade que conseguiu em direção à casa da sua amada. Ao chegar lá, descobriu que ela viajara ao fim da tarde. Já perdera o primeiro e maior de seus planos. Foi então rumo à casa de seus pais e, enquanto atravessava a ponte, seu meio de chegar lá a tempo de tentar demonstrar a sua gratidão a eles quebrou: seu automóvel. As lágrimas desciam do seu rosto, deu um grito desesperador, uma mescla de medo, angústia, desapontamento, fraqueza e inutilidade.

Começou a caminhar desolado pela lateral da ponte, enquanto deixava sua mão deslizar sobre a proteção que era oferecida a quem a utilizasse. Voltou a pensar no dia que desperdiçou e em todos outros iguais que foram também desperdiçados, que seu altruísmo barato fez com que perdesse. Ficou em pé sobre a proteção e continuou a andar sem que houvesse preocupação em se equilibrar. Arrependeu-se por não ter vivido. Antes que o seu fim chegasse, pulou da ponte para mostrar que sua última ação era um ato egoísta, como que em contraposição ao seu altruísmo, e o seu fim chegou no momento em que sua cabeça tocou a pedra rachada do chão.

domingo, 25 de novembro de 2007

Sem Ar

Como posso viver sem ar?
Sem o ar que me roubastes
durante o longo beijo
que agora custas a me dar

Como posso viver sem ar?
Sem o ar que me jogastes
no ouvido enquanto tua lingua
nele dançava, ela que agora só fala

Como posso viver sem ar?
Sem o ar tranqüilo que
parecia me oferecer e que agora
somente me ilude e deteriora

Como posso viver sem ar?
Sem o ar que perco no meu pranto
Sem o teu hálito na minha face
Sem o melhor que poderia me proporcionar

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Teus Planos

Sem teus planos
ainda viveria
Sem teus planos
ainda viveria em você

Sem teus planos
não deixaria morrer
Não fossem teus planos
teria sempre vivido

Vivi em vão
Não vivi, então
Não fossem teus planos...
Melhor sem teus planos.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Post sem poema.. só pra ressaltar que agora, às 22:00 dessa segunda, ouvindo Zeca Baleiro, o sentimento do poema aí abaixo está ainda mais forte!
E só...

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Momento de Angústia

Quero afundar
Vou mergulhar
Vou me prender ao fundo
e por lá ficar

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Dá Não

Dão-nos de presente o fél
para compensar a falta do mel
como quem cobre com um ralo véu
sem precisão a imensidão do céu